Antes da Revolução Industrial consumir quantidades elevadas de carvão em suas máquinas, um fornecimento constante desse tipo de combustível era utilizado para aquecer os ambientes e manter as cozinhas das casas em funcionamento.
Com as lareiras e fornos sendo acesas a todo momento, a utilização de chaminés era necessária para conduzir a fumaça para o lado de fora.
Para evitar a obstrução das chaminés, que poderia causar um incêndio catastrófico, estas eram limpas cerca de quatro vezes ao ano. Como os adultos eram muito grandes para executar esse tipo de trabalho — que consistia em entrar dentro da chaminé, remover as cinzas com uma escova de mão e raspar a fuligem impregnada nas paredes —, crianças pequenas eram utilizadas.
Nas gírias das ruas, tais crianças eram conhecidas como lírios brancos e geralmente eram empregadas por mestres ou pelos próprios pais, sendo que os meninos eram os preteridos, pois a limpeza das chaminés requeria um grande esforço braçal.
Além do trabalho extenuante, os garotos eram obrigados a enfrentar a claustrofobia e os perigos envolvidos na atividade. Assim como as crianças empregadas em minas de carvão, raramente tinham a oportunidade de se lavarem entre um trabalho e outro — apesar de alguns empregadores permitirem que eles se banhassem aos domingos.
A fumaça preta e sufocante provocava danos nos olhos e nos pulmões. E sendo a fuligem um elemento cancerígeno, era comum que os garotos sofressem com “Sooty Warts”, que em uma tradução literal significaria “verrugas fuliginosas”, um tipo de câncer no escroto.
O escritor inglês Samuel Pratt escreveu em 1802:
“Um garoto que limpa chaminés não é regularmente limpo uma vez na semana e mantém a sujeira e as nojeiras, ele é comumente afetado por coceiras intensas que se transformam em pequenas pústulas e logo se tornam úlceras e resultam em um câncer incurável, a consequência de obstruir a transpiração.”
Pratt ficou comovido com três irmãos que encontrou em Londres. O mais novo tinha apenas seis anos. O do meio sete e o mais velho havia acabado de fazer nove há alguns meses. Todos eram empregados por um “enorme ser sombrio, que logo depois veio com eles, amaldiçoou o aprendiz mais velho por deixar uma de suas escovas com a qual ele o atingiu nos ombros.”
Os garotos observados por Pratt estavam malvestidos e o mais novo mancava tanto que implorou ao seu mestre para que o deixasse descansar nos degraus da igreja.
“Descansar, disse aquele homem sombrio, essa é uma bela história mesmo. Tenho duas chaminés para varrer agora antes das oito e meia, em Covent Garden, e você não ouviu? St. Martin está batendo às sete horas e há umas das chaminés tão torta quanto um saca-rolhas que ninguém além de um anão como você pode rastejar para cima. Enquanto ele estava rosnando essas palavras, pegou a criança e pendurou-a sobre o ombro como teria pendurado um de seus sacos.”
“O aprendiz mais velho, que parecia estar com problemas de saúde extremos, disse-me em um sussurro temeroso quando perguntei sobre seu modo de vida e trabalho que... Se ele vivesse, preferiria ser um engraxate ou um escravo em um navio do que um limpador de chaminés, especialmente devido ao bruto que entrou naquela casa, pois ele não apenas o ‘deixa quase morrer de fome, mas espanca a mim e a meus irmãos até a morte, embora eu tenha passado por todos os climas durante meu trabalho matinal por muitos anos. Não tenho nada para dormir a não ser alguns desses sacos em um porão de fuligem. E o que é pior, meu mestre não permite que a gente se lave para ficarmos arrumados (livres de trapos) nem uma vez por mês: de modo que estou bastante dolorido com essa substância entupida que quase corroeu minha carne — apenas olhe, senhor, para esses lugares doloridos e esses grandes caroços.’”
Em 1788, um Ato do Parlamento proibiu o emprego de menores de oito anos, mas a lei era constantemente ignorada, em especial nos casos em que os meninos eram empregados pelos próprios pais.
O Incidente em Temple Bar
Em 1810, Lewis Realy foi enviado a Little Shire Lane, Temple Bar, para limpar a chaminé da casa de Suzanna Whitfield. O garoto de oito anos subiu a primeira parte da chaminé e desceu em seguida, momento em que demonstrou sua preocupação de ficar preso no interior da estrutura. Seus medos foram ignorados e ele foi obrigado a subir outra vez. Com a falta de comunicação, um outro garoto, William Best, escalou parte da chaminé e tentou puxar Lewis pelas pernas. A tentativa falhou e um pedreiro foi chamado para ajudar no resgate. O pequeno Lewis não teve a sorte de ser resgatado com vida.
Em 1817, uma lei foi aprovada no Parlamento para banir a prática de utilizar crianças, mas foi descartada pela Câmara dos Lordes no ano seguinte.
O emprego de meninos na limpeza de chaminés foi banido da Inglaterra apenas em 1875.
Fontes:
Regency Slang Revealed: Grose's Dictionary of the Vulgar Tongue & Later Versions Organised & Indexed - Louise Allen Ph.
Jane Austen's England - Roy e Lesley Adkins (pág.75-79)
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